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O problema do devedor contumaz - 29/10/2025 - Opinião - Folha
O Brasil é um país desigual. No campo econômico, jurídico e social, são evidentes as discrepâncias de tratamento político e jurídico entre as classes sociais, raças e gêneros.
Existem políticas em andamento para enfrentar ou reduzir tais desigualdades, como programas de redistribuição de renda, reformas tributárias com foco na tributação progressiva e ações afirmativas, dentre outras.
Todas são relevantes, mas é preciso cuidar do outro lado dessa moeda: os privilégios legais insustentáveis, que beneficiam certas pessoas e grupos, usados para proteger acúmulos de capital ilícito, e que colocam seus beneficiários em uma posição de desigualdade em relação a todos os demais integrantes da sociedade.
Falamos aqui dos sonegadores contumazes. Aqueles que, de forma reiterada, subtraem dos cofres públicos valores consideráveis, organizam sua atividade econômica em torno da ocultação e da fraude fiscal. São agentes econômicos que constroem seu patrimônio por meio de delitos fazendários, descumprem abertamente as regras seguidas pelos demais empresários e, por isso, têm vantagens econômicas substanciais. Trata-se de um número pequeno, cerca de 1.200 pessoas, que acumulam mais de R$ 200 bilhões em débitos tributários. Sua conduta afeta a livre concorrência, o ambiente de negócios e lesiona o fisco, dificultando o equilíbrio das contas públicas e o financiamento de programas sociais relevantes.
Não existe no Brasil um marco legal para o enfrentamento desse tipo de sonegação. Seus agentes recebem benefícios fiscais, participam de licitações, disputam concessões. Quando respondem pelo crime fiscal, podem aguardar tranquilos o trâmite processual até o final, até o julgamento de todos os seus recursos, porque, caso sejam condenados, sua punição será extinta se decidirem acertar suas contas com o fisco.
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Quem pratica qualquer crime patrimonial comum, como furto ou apropriação indébita, é punido mesmo que restitua o bem ou ressarça o dano, a qualquer tempo. Já o sonegador, mesmo contumaz, deixa de ser castigado quando paga seu débito, ainda que depois de uma condenação definitiva, o que incentiva a protelação da satisfação do débito por anos e anos.
Nenhum outro país sério trata com tanta benevolência aquele que descumpre as regras fiscais com contumácia. Enquanto todos observam suas obrigações, esse devedor segue desassombrado, fazendo do crime a escada para suas conquistas patrimoniais, muitas vezes recebendo aplausos de uma sociedade desavisada.
Para enfrentar essa situação, está em discussão no Senado Federal o projeto de lei complementar 125/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte. Dentre outras disposições, cria a figura do devedor contumaz: aquele que, no âmbito federal, tem contra si créditos tributários inscritos de valor igual ou superior a R$ 15 milhões, equivalentes a mais de 100% de seu patrimônio conhecido, e mantém essa situação irregular em pelo menos quatro períodos de apuração consecutivos -- ou em seis períodos de apuração alternados, no prazo de 12 meses, desde que não existam justificativas consistentes para tal conduta, como calamidades, apuração de resultados negativos ou ausência de fraudes à execução fiscal.
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Caso seja considerado contumaz, o devedor será impedido de fruir de benefícios fiscais, de participar de licitações, de formalizar vínculos com a administração pública (autorizações, licenças, habilitações, concessões) e será declarado inapto na inscrição do cadastro de contribuintes da respectiva administração tributária. Mais: não poderá ser beneficiado com a extinção da punição penal caso satisfaça os débitos, ficando revogado o inexplicável privilégio, ao menos em relação a esses agentes.
Quem faz do crime fiscal um trampolim para o sucesso empresarial deve ser tratado de forma diferente e com mais rigor. A medida é legítima e não demanda grandes argumentos em sua defesa. A dificuldade na tramitação do projeto de lei revela a resiliência e a força daqueles que se beneficiam de uma legislação anacrônica, abraçam privilégios mascarados e se esforçam para fazer do Brasil um país desigual em todos os aspectos.
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TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Existem políticas em andamento para enfrentar ou reduzir tais desigualdades, como programas de redistribuição de renda, reformas tributárias com foco na tributação progressiva e ações afirmativas, dentre outras.
Todas são relevantes, mas é preciso cuidar do outro lado dessa moeda: os privilégios legais insustentáveis, que beneficiam certas pessoas e grupos, usados para proteger acúmulos de capital ilícito, e que colocam seus beneficiários em uma posição de desigualdade em relação a todos os demais integrantes da sociedade.
Falamos aqui dos sonegadores contumazes. Aqueles que, de forma reiterada, subtraem dos cofres públicos valores consideráveis, organizam sua atividade econômica em torno da ocultação e da fraude fiscal. São agentes econômicos que constroem seu patrimônio por meio de delitos fazendários, descumprem abertamente as regras seguidas pelos demais empresários e, por isso, têm vantagens econômicas substanciais. Trata-se de um número pequeno, cerca de 1.200 pessoas, que acumulam mais de R$ 200 bilhões em débitos tributários. Sua conduta afeta a livre concorrência, o ambiente de negócios e lesiona o fisco, dificultando o equilíbrio das contas públicas e o financiamento de programas sociais relevantes.
Não existe no Brasil um marco legal para o enfrentamento desse tipo de sonegação. Seus agentes recebem benefícios fiscais, participam de licitações, disputam concessões. Quando respondem pelo crime fiscal, podem aguardar tranquilos o trâmite processual até o final, até o julgamento de todos os seus recursos, porque, caso sejam condenados, sua punição será extinta se decidirem acertar suas contas com o fisco.
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Para enfrentar essa situação, está em discussão no Senado Federal o projeto de lei complementar 125/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte. Dentre outras disposições, cria a figura do devedor contumaz: aquele que, no âmbito federal, tem contra si créditos tributários inscritos de valor igual ou superior a R$ 15 milhões, equivalentes a mais de 100% de seu patrimônio conhecido, e mantém essa situação irregular em pelo menos quatro períodos de apuração consecutivos -- ou em seis períodos de apuração alternados, no prazo de 12 meses, desde que não existam justificativas consistentes para tal conduta, como calamidades, apuração de resultados negativos ou ausência de fraudes à execução fiscal.
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Quem faz do crime fiscal um trampolim para o sucesso empresarial deve ser tratado de forma diferente e com mais rigor. A medida é legítima e não demanda grandes argumentos em sua defesa. A dificuldade na tramitação do projeto de lei revela a resiliência e a força daqueles que se beneficiam de uma legislação anacrônica, abraçam privilégios mascarados e se esforçam para fazer do Brasil um país desigual em todos os aspectos.
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