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É urgente repensar o modelo de relações de trabalho no Brasil
Digital 03/10/2025 03:16 Fonte: O Globo Por: O Globo Relevância: 30

É urgente repensar o modelo de relações de trabalho no Brasil

O Brasil precisa enfrentar, com coragem e responsabilidade, um debate que vem sendo adiado há décadas: a modernização das relações de trabalho. Nosso modelo atual é ineficiente, caro e incapaz de responder às necessidades da economia globalizada e em constante transformação. Os sinais estão claros, e ignorá-los significa comprometer o futuro do país.
O rombo crescente da Previdência é um exemplo. A base de contribuintes encolhe a cada ano, pressionada por um índice elevado de informalidade e pela multiplicação de regimes especiais. Segundo a última PNAD Contínua do IBGE, a informalidade no Brasil, entre fevereiro e maio, foi de 37,8% da população ocupada, o equivalente a 39,3 milhões de pessoas sem carteira assinada ou contribuição previdenciária regular. Milhões recebem benefícios sem ter contribuído de forma consistente. É uma conta insustentável para as próximas gerações. Sem ampliar a formalização, não haverá equilíbrio fiscal.
Parte desse desafio está na rigidez da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), criada há 82 anos. Ela não reflete as transformações da economia digital, do trabalho remoto ou dos modelos híbridos. O peso dos encargos e obrigações sufoca as empresas que cumprem a lei e incentiva práticas como a "pejotização" irregular, ampliando a informalidade. É urgente reformular a CLT para oferecer segurança jurídica, competitividade e proteção ao trabalhador.
Outro ponto sensível é a discussão sobre a jornada de trabalho. A proposta apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP) -- extinguir o regime 6x1 sem redução de salário -- pode gerar impactos severos. Em muitos setores, formatos como 5x2 ou 4x3, quando impostos sem negociação e aumento de produtividade, geram mais custo e dificultam o atendimento às demandas de produção. Levantamento da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais mostra que a redução da jornada nessas condições pode comprometer até 16% do PIB e resultar em queda de até R$ 2,9 trilhões no faturamento dos setores produtivos. É preciso buscar modelos mais flexíveis, negociados coletivamente e adaptados à realidade de cada área.
A situação se agrava com a expansão de programas sociais sem contrapartidas. Auxílios como o Bolsa Família são essenciais para combater a pobreza, mas devem servir como trampolim para um emprego formal. A ausência de condicionantes como cursos de qualificação, busca ativa por emprego ou atualização cadastral cria incentivos que competem com o mercado formal e oneram ainda mais o orçamento público.
O resultado dessa combinação -- rigidez trabalhista, custo de contratação e programas assistenciais mal calibrados -- é um paradoxo: a indústria, o comércio e os serviços enfrentam falta de mão de obra qualificada, enquanto milhões de brasileiros aptos a trabalhar permanecem fora do mercado formal, vivendo de "bicos", sem direitos nem proteção.
Enquanto outros países modernizam suas leis para equilibrar proteção social e estímulo à empregabilidade, o Brasil segue preso a fórmulas ultrapassadas que limitam a produtividade e o crescimento. Reformas estruturantes na Previdência, na legislação trabalhista e na política de transferência de renda são urgentes para garantir sustentabilidade fiscal, competitividade e dignidade ao trabalhador.
É hora de superar discursos simplistas, enfrentar o debate e criar condições para que o país gere mais empregos, fortaleça a produção e assegure, hoje e no futuro, um sistema previdenciário sólido e sustentável.

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