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Discurso no 7/9, plano de assassinatos, minuta, atos de 8/1; argumentos de Moraes contra Bolsonaro
Geral 09/09/2025 18:02 Fonte: O TEMPO Por: O TEMPO Relevância: 20

Discurso no 7/9, plano de assassinatos, minuta, atos de 8/1; argumentos de Moraes contra Bolsonaro

BRASÍLIA - O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu nesta terça-feira (9/9) a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos outros sete réus do chamado "núcleo crucial". Ao apresentar seu voto no julgamento sobre a suposta tentativa de golpe de Estado, o magistrado disse que eles "praticaram todas as infrações penais imputadas pela Procuradoria Geral da República (PGR)".
Moraes, que é o relator da ação penal analisada pela Primeira Turma do STF, garantiu haver provas suficientes de que Bolsonaro liderou a "organização criminosa" para dar o golpe de Estado que lhe garantiria a permanência no poder, mesmo após a derrota nas ruas para Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022.
"Jair Messias Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para a implementação de seu projeto autoritário de poder, conforme fartamente demonstrado nos autos", afirmou o magistrado.
Quem são os oito acusados de integrar o "núcleo crucial":
* Jair Bolsonaro: capitão do Exército de 1973 a 1988, foi presidente da República de 2019 a 2022;
* Alexandre Ramagem: diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro, foi delegado da Polícia Federal (PF); atualmente, é deputado federal;
* Almir Garnier: comandante da Marinha na gestão Bolsonaro, é almirante de Esquadra da Marinha;
* Anderson Torres: ministro da Justiça no governo Bolsonaro e delegado da PF, era secretário de Segurança do Distrito Federal nos atos de 8 de janeiro de 2023;
* Augusto Heleno: ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) de Bolsonaro, é general da reserva do Exército;
* Mauro Cid: ex-ajudante de ordens da Presidência, era um dos principais assessores de Bolsonaro; é tenente-coronel do Exército;
* Paulo Sérgio Nogueira: ministro da Defesa na gestão Bolsonaro, é general do Exército;
* Walter Braga Netto: general da reserva do Exército, foi ministro da Casa Civil e da Defesa de Bolsonaro, e vice na chapa do ex-presidente em 2022.
Os oito réus são acusados dos seguintes crimes:
* Abolição violenta do Estado democrático de direito;
* Golpe de Estado;
* Organização criminosa;
* Dano qualificado ao patrimônio da União;
* Deterioração de patrimônio tombado.
A exceção é Ramagem que, por ocupar mandato de deputado, responderá agora somente pelas acusações de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolir o Estado democrático de direito e organização criminosa. O julgamento dos outros dois crimes deve ser retomado pela Justiça quando ele deixar o cargo.
Os 13 atos que Moraes citou contra Moraes e aliados
Durante seu voto, que tomou mais de cinco horas das duas sessões desta terça-feira, Alexandre de Moraes apresentou 13 atos que, segundo ele, demonstram a formação de uma "organização criminosa" para elaborar e executar o plano golpista.
Em uma apresentação de slides, Moraes mostrou momentos, entre junho de 2021 e 8 de janeiro de 2023, que evidenciariam a atuação do grupo criminoso liderado por Bolsonaro e integrado por militares de alta patente, incluindo generais do Exército que ocuparam alguns dos principais cargos do governo do ex-presidente.
Veja a seguir a linha do tempo e os episódios descritos por Moraes no plenário da Primeira Turma do STF - o colegiado é formado por cinco ministros, que vão definir o destino de Bolsonaro e dos outros sete réus:
* Uso de órgãos públicos para o monitoramento de adversários políticos e execução de ataques ao Poder Judiciário;
* Atos executórios públicos com graves ameaças à Justiça Eleitoral: live de 29 de julho de 2021, entrevista de 3 de agosto de 2021 e live de 4 de agosto de 2021;
* Tentativa, com emprego de grave ameaça, de restringir o exercício do Poder Judiciário em 7 de setembro de 2021, quando Bolsonaro fez discurso contra Moraes e o Supremo;
* Reunião ministerial de 5 de julho de 2022, em que Bolsonaro pediu aos ministros para atacar o sistema eleitoral - filmada e usada como uma das principais provas;
* Reunião com embaixadores de 18 de julho de 2022, em que Bolsonaro falou sobre irregularidades nas urnas, sem apresentar provas - ficou inelegível por causa desse episódio;
* Uso indevido da estrutura da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no 2° turno das eleições presidenciais, quando blitze foram realizadas para dificultar o trânsito de eleitores de Lula, principalmente no Nordeste;
* Utilização indevida da estrutura das Forças Armadas, com a confecção de de Relatório de Fiscalização do Sistema Eletrônico de Votação do Ministério da Defesa;
* Atos executórios após o 2° turno das eleições: live em 4 de novembro de 2022; ações de monitoramento de autoridades em 21 de novembro de 2022; representação eleitoral para verificação extraordinária; reunião dos "kids pretos" em 28 de novembro de 2022; e elaboração da Carta ao Comandante;
* Planejamento do plano "Punhal Verde e Amarelo" e da "Operação Copa 2022", que previam os assassinatos de Moraes, de Lula do seu vice, Geraldo Alckmin (PSB);
* Atos executórios seguintes ao "Punhal Verde e Amarelo": Monitoramento do presidente eleito [Lula], "Operação Luneta", "Operação 142" e "Discurso pós-golpe";
* Elaboração da chamada "Minuta do Golpe do Estado" e apresentação aos comandantes das Forças Armadas para que aderissem ao plano golpista;
* Tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023, com invasão e depredação das sedes dos Três Poderes e posterior intervenção militar;
* Instalação de um gabinete de crise após a consumação do golpe de Estado, com Bolsonaro como presidente, apoiado pelas Forças Armadas.
Moraes diz não ter dúvida de que houve tentativa de golpe de Estado
Alexandre de Moraes afirmou, logo no início da sessão desta terça-feira, que o julgamento não visa comprovar se houve uma tentativa de golpe de Estado liderada por Bolsonaro, porque, segundo ele, há provas suficientes sobre esse crime.
"Esse julgamento não discute se houve tentativa ou não tentativa de golpe. O que discute é a autoria, se os réus participaram. Não há nenhuma dúvida em todas as condenações de que houve tentativa de abolição ao Estado democrático de direito, que houve formação de organização criminosa e que houve dano ao patrimônio público. O que se analisa é a autoria das infrações penais imputadas", afirmou Moraes.
"O conjunto é de uma organização criminosa sobre a liderança de Jair Messias Bolsonaro, é que durante o período de julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023. Essa organização criminosa, com divisão de tarefas e hierarquizado, praticou vários atos executórios", prosseguiu.
"Primeiro, atentar contra o Estado democrático de direito, pretendendo restringir ou suprimir, mediante grave ameaça, a atuação de um dos Poderes do Estado. Neste caso, o Judiciário. E ainda atos executórios para consumir, por meio de violência ou grave ameaça, um governo legitimamente constituído", elencou Moraes.
"No primeiro crime, não há derrubada do governo eleito. No segundo crime, o sujeito passivo é o Executivo. São coisas absolutamente diversas. Ou seja, há a possibilidade de, durante um governo legitimamente eleito, não se contentando com decisões judiciais, atuar com grave ameaça para restringir. Fecha o Congresso. AI-2: aumenta o número de ministros do Supremo, aumenta o habeas corpus. Isso tem como finalidade que um governo que está no poder se mantenha no poder sem um sistema de freios e contrapesos", completou.
Reunião com embaixadores foi 'tentativa de entreguismo', diz Moraes
Alexandre de Moraes classificou a reunião de Jair Bolsonaro com embaixadores no Palácio da Alvorada, em 2022, como "um dos momentos de maior entreguismo nacional".
Na reunião citada, em julho de 2022, Bolsonaro convocou representantes de outros países para questionar as urnas eletrônicas e atacar ministros do STF. Para Moraes, a agenda foi um dos atos de execução de um plano golpista para caso ele perdesse as eleições para Lula.
Em seguida, Moraes fez menção às recentes sanções do governo dos Estados Unidos contra o Brasil, com o apoio e a articulação de pessoas próximas ao ex-presidente, como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho de Jair Bolsonaro.
"Na verdade, eu diria que talvez entre para a história como um dos momentos de maior entreguismo nacional, ou tentativa de entreguismo nacional. Mas, na verdade, os últimos acontecimentos demonstram que essa reunião foi só preparatória para uma tentativa de retorno à posição de colônia brasileira, só que não mais em Portugal", disse o ministro.
"Trata-se de um dos episódios mais graves de deslegitimação institucional já registrados em nossa história democrática", completou.
Moraes diz que agenda de Heleno não era 'meu querido diário'
Em outro momento do seu voto, Moraes afirmou que não pode ser apontado como "razoável" o general Augusto Heleno, então ministro do governo de Jair Bolsonaro, ter uma agenda de anotações com teor "golpista". O relator disse que os escritos não se tratam de um "meu querido diário".
"Não é razoável achar normal um general quatro estrelas do Exército, um ministro do GSI, ter uma agenda com anotações golpistas. Ter uma agenda preparando a execução de atos para deslegitimar as eleições, o Poder Judiciário, e se perpetuar no poder. Não consigo entender como alguém pode achar normal em uma democracia, em pleno século XXI, uma agenda golpista", disse.
"Dizer que as anotações feitas no documento eram particulares, uma espécie de 'meu querido diário", não é razoável", continuou Moraes. Em seguida, ele destacou que o próprio Heleno, que foi ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e era um dos auxiliares mais próximos de Bolsonaro, confirmou que era o autor das anotações e dono da agenda apreendida pela PF.
Convocação de militares às vésperas do fim do mandato
Moraes disse que a investigação da PF mostrou que, ao não ver uma "saída jurídica" depois da derrota nas urnas, Bolsonaro se "concentrou" nos comandantes militares para decretar uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para se manter no poder.
"Por que o presidente da República, às vésperas de terminar o seu mandato, convocaria os comandantes das Forças Armadas para discutir a sua manutenção no poder? Essa foi a reunião. A perpetuação no poder. Na ausência de um instrumento jurídico de impugnação, só restava um instrumento, a força. GLO, a intervenção militar", afirmou Moraes.
"Claro e cristalino é o que o então presidente, líder dessa organização criminosa, pretendia era tão somente um apoio, porque, obviamente, sem tropas, ele não conseguiria naquele momento. Foi tentar um outro ato executório", continuou o ministro.
"E aqui a autoria mediata é muito clara, é muito óbvia. Se não conseguir que os comandantes militares apoiem o golpe do Estado antes de terminar meu mandato, o que eu faço? Continuo demonstrando que não reconheço a legitimidade das eleições", completou.
Moraes lembrou que o chefe da Marinha, Almir Garnier, chegou a colocar as tropas à disposição de Bolsonaro para o golpe. "Não é golpista só quem oferece as tropas, quem pede as tropas também é. Quem pede tropas militares consuma crime que se tentou por todos os meios", ressaltou.
O ministro também disse não haver dúvida de que a "minuta do golpe" levada a Bolsonaro previa a prisão de autoridades. Moraes lembrou do detalhamento do texto, feito pelo delator Mauro Cid, e destacou que não há previsão de estado de defesa que decrete prisões arbitrárias de ministros do Supremo e de presidentes do Senado.
Moraes compara mensagem de Ramagem a 'delinquente do PCC'
Alexandre de Moraes comparou uma mensagem do então presidente da Abin, Alexandre Ramagem, ao então presidente Jair Bolsonaro sobre as urnas eletrônicas à atuação de um "delinquente do PCC".
O ministro abordou o que, segundo ele, seria a atuação de Ramagem contra as urnas eletrônicas. E citou uma mensagem em que o hoje deputado federal afirma haver um "total descrédito" do sistema de votação perante a população.
"Isso não é uma mensagem de um delinquente do PCC para outro. Isso é uma mensagem do diretor da Abin para o então presidente da República. [...] A organização criminosa já dizia que conseguiram atacar o sistema de inicialização da urna para gerar um boletim de urna diferente do original, iniciar os atos executórios para se manter no poder independentemente de qualquer coisa e para afastar o controle judicial previsto constitucionalmente", disse Moraes.
Na mensagem lida por Moraes, Ramagem diz a Bolsonaro que mantém "total certeza de que houve fraude nas eleições de 2018, com vitória do senhor no 1º turno" e que se deve dar "continuidade àqueles argumentos, com devida e constante publicidade". O conteúdo seria parte da estratégia para descredibilizar as urnas e criar um ambiente de instabilidade no país, no entendimento de Moraes.
"A comprovação é de que, durante a gestão do réu Alexandre Ramagem, a Abin efetivamente funcionou como uma clandestina. Foram monitorados quatro ministros do Supremo Tribunal Federal: este relator, o ministro Dias Toffoli, o ministro Luiz Fux e o ministro Luís Roberto Barroso, assim como diversos congressistas, deputados e senadores", complementou Moraes.
Fux anuncia que vai divergir de Moraes
O ministro Luiz Fux anunciou nesta terça-feira, no início da fase final do julgamento do núcleo central da trama golpista, que vai divergir de Alexandre de Moraes nas questões preliminares apresentadas pelas defesas dos réus.
"O senhor está votando as preliminares; eu vou me reservar o direito de voltar a elas na oportunidade em que eu vou votar, porque, desde o recebimento da denúncia, por questão de coerência, eu sempre ressalvei e fui vencido nessas questões, de sorte que vou voltar a essa", disse Fux.
Ele pediu a palavra assim que Moraes começou a fazer uma avaliação das alegações dos defensores. Fux se manifestou após Moraes avisar que analisaria pedidos preliminares das defesas e, em seguida, iniciaria seu voto, sem submetê-los aos demais integrantes da Primeira Turma.
Fux disse que, embora acompanhe a dinâmica de Moraes, pretende retomar o debate sobre esses pontos quando for sua vez de votar: "Assim como vossa excelência está indo direto ao voto, eu também vou, mas farei referência às questões processuais quando chegar a minha vez."
Moraes, por sua vez, ressaltou que todas as preliminares já haviam sido rejeitadas, muitas delas por unanimidade, e que não houve fato novo que justificasse reabrir a discussão.
"Todas as preliminares a que me referi até o momento foram votadas por unanimidade, inclusive com o voto de vossa excelência. A preliminar de incompetência do Supremo Tribunal Federal e, subsidiariamente, da Primeira Turma para processamento e julgamento, também foi afastada no momento do recebimento da denúncia, por maioria de votos", afirmou.
Desde o início do julgamento especulava-se que Fux poderia abrir divergência ao relator, diante da postura que tem tomado em outras votações relativas ao processo.
No recebimento da denúncia feita pela PGR, por exemplo, o ministro foi o único a ser contra a condução do julgamento pelo Supremo e pela Primeira Turma do tribunal.
Na condição de relator, Moraes foi o primeiro a apresentar o seu voto. Fux será o terceiro a votar, o que deve acontecer na sessão de quarta-feira (10/9).
O colegiado é formado por cinco ministros. A expectativa é que, além de Moraes, Flávio Dino apresente seu voto nesta terça-feira.
Na quarta-feira haverá sessão apenas pela manhã. Já na quinta-feira (11/9), haverá sessões de manhã e à tarde. Depois de Fux, votarão Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. A Primeira Turma reservou duas sessões na sexta-feira (12/9), quando é esperado o desfecho do julgamento.
Com os votos dos cinco ministros e uma provável maioria pela condenação, haverá uma nova discussão, sobre o cálculo das penas a serem atribuídas a cada réu. Se o tempo não for suficiente para isso, a parte final do julgamento poderá ser adiada para a semana seguinte.
O julgamento começou na última terça-feira (2/9), quando Moraes apresentou seu relatório sobre o caso e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu a condenação de todos os réus. No mesmo dia, falaram advogados de quatro réus.
Já na quarta-feira (3/9), apresentaram seus argumentos os advogados de Jair Bolsonaro e dos generais Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Os defensores dos oito réus pediram a absolvição dos clientes.

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