
Geral
04/10/2025 04:28
Fonte: A Tribuna
Por: A Tribuna
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A Tribuna MT - O erro estratégico do Brasil na Educação Infantil
Encher a despensa. Foi essa a expressão que ouvi recentemente para definir o que precisamos realizar durante os anos da Educação Infantil. A metáfora me marcou porque traduz com clareza a realidade que observo não apenas nas escolas com as quais atuo, mas também em experiências que acompanhei em diferentes sistemas educacionais ao redor do mundo.
Enquanto as crianças são pequenas e estão apenas iniciando sua trajetória escolar, cabe a nós abastecer suas despensas com a maior diversidade de ingredientes. É essa variedade que permitirá, mais adiante, preparar um cardápio rico no Ensino Fundamental e nas etapas seguintes. Não se faz brigadeiro só com farinha de trigo; é preciso ter leite condensado e chocolate, minimamente. Assim, também na Educação Infantil, desde cedo vamos construindo uma despensa simbólica da qual a criança poderá se servir no futuro, ampliando e aprofundando seus aprendizados.
Hoje já não resta dúvida de que investir na primeira infância potencializa todo o percurso educacional. Neurocientistas têm demonstrado como o cérebro humano apresenta enorme plasticidade nos primeiros anos de vida, respondendo de forma intensa as atividades propostas pelos professores. Por isso, em vários países, os profissionais mais preparados e com maior sofisticação acadêmica são designados justamente para atuar na Educação Infantil. Essa escolha não é aleatória: exige-se muito conhecimento, experiência e técnica para apoiar o desenvolvimento integral das crianças. É por isso que, em nações que avançaram nos resultados educacionais, a primeira infância ocupa lugar de protagonismo no sistema de ensino.
É justamente nesse ponto que reside o equívoco do Brasil. Em muitos contextos, ainda restringimos a Educação Infantil a uma função predominantemente assistencial. Garantir acolhimento e cuidado é, sim, fundamental -- famílias precisam de escolas e creches seguras e acessíveis.
No entanto, limitar essa etapa a esse papel é desperdiçar um potencial imenso. Uma criança que, desde cedo, experimenta o mundo mediada por professores qualificados terá sempre consigo um repertório amplo e diversificado que contribui para o desenvolvimento da autonomia, da criatividade, do pensamento crítico, da capacidade de expressão e da convivência.
É preciso lembrar que brincar, contar histórias, explorar a natureza, cantar, desenhar e interagir em grupo não são atividades secundárias: são experiências fundadoras de aprendizagens futuras. Quando negligenciamos essas vivências ou as tratamos como simples passatempo, retiramos das crianças a chance de desenvolver habilidades que serão essenciais para toda a vida escolar e social.
E, se ainda assim, todos esses argumentos não forem suficientes, há também o aspecto econômico. Investir na Educação Infantil traz retorno direto em cidadania, equidade e redução de desigualdades. Estudos de organismos internacionais, como a OCDE e o Banco Mundial, apontam que cada real investido nessa etapa gera benefícios multiplicados em saúde, renda e qualidade de vida. Quando essa fase não é tratada com a devida importância, o resultado é previsível: alunos chegam ao Ensino Fundamental com lacunas enormes, que exigem esforços custosos de tempo e recursos para serem superadas -- muitas vezes sem pleno sucesso. A consequência é uma bola de neve: dificuldades acumuladas, baixo desempenho, desmotivação e evasão escolar.
Assim, defender a Educação Infantil não é apenas uma causa pedagógica ou social, mas também uma decisão estratégica para o futuro do país. Uma sociedade que compreende isso assume um compromisso com o desenvolvimento humano em sua forma mais completa.
É chegada a hora de reconhecer a Educação Infantil como uma estratégia nacional, não para antecipar o trabalho do Ensino Fundamental, mas para confirmar a sabedoria da expressão: "encher a despensa" e, com isso, cozinhar com fartura e consistência nas próximas etapas da escolaridade.
Portanto, cada minuto dessa etapa conta. Conta para cada criança e conta para a sociedade inteira. É nesse início que se decide, em grande medida, a qualidade do futuro que construiremos.
(*) Acedriana Vogel é diretora pedagógica da Aprende Brasil Educação
Enquanto as crianças são pequenas e estão apenas iniciando sua trajetória escolar, cabe a nós abastecer suas despensas com a maior diversidade de ingredientes. É essa variedade que permitirá, mais adiante, preparar um cardápio rico no Ensino Fundamental e nas etapas seguintes. Não se faz brigadeiro só com farinha de trigo; é preciso ter leite condensado e chocolate, minimamente. Assim, também na Educação Infantil, desde cedo vamos construindo uma despensa simbólica da qual a criança poderá se servir no futuro, ampliando e aprofundando seus aprendizados.
Hoje já não resta dúvida de que investir na primeira infância potencializa todo o percurso educacional. Neurocientistas têm demonstrado como o cérebro humano apresenta enorme plasticidade nos primeiros anos de vida, respondendo de forma intensa as atividades propostas pelos professores. Por isso, em vários países, os profissionais mais preparados e com maior sofisticação acadêmica são designados justamente para atuar na Educação Infantil. Essa escolha não é aleatória: exige-se muito conhecimento, experiência e técnica para apoiar o desenvolvimento integral das crianças. É por isso que, em nações que avançaram nos resultados educacionais, a primeira infância ocupa lugar de protagonismo no sistema de ensino.
É justamente nesse ponto que reside o equívoco do Brasil. Em muitos contextos, ainda restringimos a Educação Infantil a uma função predominantemente assistencial. Garantir acolhimento e cuidado é, sim, fundamental -- famílias precisam de escolas e creches seguras e acessíveis.
No entanto, limitar essa etapa a esse papel é desperdiçar um potencial imenso. Uma criança que, desde cedo, experimenta o mundo mediada por professores qualificados terá sempre consigo um repertório amplo e diversificado que contribui para o desenvolvimento da autonomia, da criatividade, do pensamento crítico, da capacidade de expressão e da convivência.
É preciso lembrar que brincar, contar histórias, explorar a natureza, cantar, desenhar e interagir em grupo não são atividades secundárias: são experiências fundadoras de aprendizagens futuras. Quando negligenciamos essas vivências ou as tratamos como simples passatempo, retiramos das crianças a chance de desenvolver habilidades que serão essenciais para toda a vida escolar e social.
E, se ainda assim, todos esses argumentos não forem suficientes, há também o aspecto econômico. Investir na Educação Infantil traz retorno direto em cidadania, equidade e redução de desigualdades. Estudos de organismos internacionais, como a OCDE e o Banco Mundial, apontam que cada real investido nessa etapa gera benefícios multiplicados em saúde, renda e qualidade de vida. Quando essa fase não é tratada com a devida importância, o resultado é previsível: alunos chegam ao Ensino Fundamental com lacunas enormes, que exigem esforços custosos de tempo e recursos para serem superadas -- muitas vezes sem pleno sucesso. A consequência é uma bola de neve: dificuldades acumuladas, baixo desempenho, desmotivação e evasão escolar.
Assim, defender a Educação Infantil não é apenas uma causa pedagógica ou social, mas também uma decisão estratégica para o futuro do país. Uma sociedade que compreende isso assume um compromisso com o desenvolvimento humano em sua forma mais completa.
É chegada a hora de reconhecer a Educação Infantil como uma estratégia nacional, não para antecipar o trabalho do Ensino Fundamental, mas para confirmar a sabedoria da expressão: "encher a despensa" e, com isso, cozinhar com fartura e consistência nas próximas etapas da escolaridade.
Portanto, cada minuto dessa etapa conta. Conta para cada criança e conta para a sociedade inteira. É nesse início que se decide, em grande medida, a qualidade do futuro que construiremos.
(*) Acedriana Vogel é diretora pedagógica da Aprende Brasil Educação